Novidades

O que o longa Extremely Wicked, Shockingly Evil and Vile revela sobre o avanço do gênero true crime

O filme da Netflix, estrelado por Zac Efron e Lily Collins, é mais uma das produções focada em serial killers e assassinatos que ganhou atenção do público


POR ANA FLÁVIA SANÇÃO

Ted Bundy (Zac Efron) e Liz (Lily Collins) (Foto: Netflix/Divulgação)


Elizabeth Kloepfer sai da sala de visitas, joga a pasta confidencial com a foto do corpo de uma das vítimas assassinadas, revela o local onde a cabeça da universitária foi enterrada e deixa os investigadores para trás. No corredor da prisão, tomada por uma emoção forte, desliza pela parede e chora pelos anos de sofrimento que passou por causa de seu romance com o famoso assassino Ted Bundy. 

Vencedora convicta de doze Emmy Awards e quatro Golden Globes   dentre os prêmios, categorias como melhor minissérie, melhor ator e atriz, melhor direção , American Crime Story foi um dos marcos do true crime na televisão. Uma produção dos estúdios Fox, a primeira temporada trouxe o julgamento do jogador OJ Simpson (OJ Simpson vs The People), após ser acusado de assassinar sua ex-esposa; e a segunda, o assassinato do estilista Gianni Versace (The Assassination of Gianni Versace) e os crimes de Andrew Cunanan, responsável pelo homicídio.



O trecho retratado faz parte da última cena contracenada por Lily Collins (Elizabeth Liz Kloepfer) e Zac Efron (Ted Bundy) no longa Extremely Wicked, Shockingly Evil and Vile, lançado esse ano pela Netflix, com direção de Joe Belinger. Esperada por muitos fãs do gênero true crime, além de trazer Zac numa atuação inédita dentre seu leque de trabalhos, a história trouxe igualmente um roteiro inovador a vida de um assassino em série contada pelos olhos não dele, mas de sua namorada. 

Desde o começo da narrativa, vemos Liz se apaixonar e depositar suas esperanças de um futuro promissor no encantador Ted, que conhecera num bar logo após terminar um relacionamento. Secretária e mãe de uma filha bebê, ela vê nele uma vida estável e saudável. No entanto, desde o início, Ted demonstra ter uma personalidade evasiva, que o levava a passar muito tempo fora de casa e ter comportamentos misteriosos e oscilantes. Quando ele é preso pela primeira vez, Liz não faz nada além de apoiá-lo ele jamais poderia ser o culpado por todos aqueles assassinatos. 

Conforme o enredo avança, a crueldade dos fatos começa a cair sobre os ombros de Liz. Com mais e mais acusações contra Ted, ela cai em depressão sem saber se acredita na inocência de quem até então pensou ser o amor de sua vida ou se passa a absorver e aceitar os fatos de que ele talvez não fosse quem ela pensava que era. Do outro lado, Ted mostra cada vez mais sua personalidade narcisista, prepotente, insistente e excentricamente eufórica. Faz de seus julgamentos um espetáculo e manipula qualquer um que esteja ao seu lado. Através de takes de perfil com enquadramento fechado, Zac Efron prova que consegue atuar em papéis sérios e com maior credibilidade, diferente das comédias e filmes de ação, como Baywatch (mal feito até para o gênero), os quais participou nos últimos anos. Lily Collins também não deixa a desejar e se consolida como uma das escolhas carro-chefe da Netflix (em 2017, teve o papel principal em O Mínimo Para Viver, história sobre uma jovem que luta contra anorexia). 

Extremely Wicked, Shockingly Evil and Vile, ainda não disponível na plataforma brasileira, com previsão para novembro deste ano, é mais uma das produções audiovisuais sobre serial killers e famosos casos criminais que vêm tomando maior espaço dentro do cinema, da televisão e das plataformas de streaming

Agentes do FBI Bill Tench (Hold McCallany)  e Holden Ford (Jonathan Gross)  em MindHunter (Foto: Netflix/Divulgação)

Em 2017, MindHunter foi um dos grandes lançamentos da Netflix. Em 10 episódios, vemos Holden Ford (Jonathan Gross) e Bill Tench (Hold McCallany) construir a primeira pesquisa comportamental sobre mentes criminosas nos EUA, cujas análises levam à criação do termo serial killer, antes desconhecido pelas autoridades e população norte-americana. A série foi baseada no livro de mesmo nome dos agentes do FBI John Douglas e Mark Oshalker. 

Não só MindHunter, a maior plataforma de streaming atual também oferece outras produções famosas que abordam assassinatos em diferentes formatos, como Making a Murderer, série documental que conta a história de Steven Avery; Investigação Criminal, série brasileira que fala sobre o caso Isabella Nardoni; The Confession Tapes, cujos episódios apresentam acusados de crimes que supostamente foram obrigados pela polícia a confessar assassinatos que não cometeram;  Conversando com um serial killer: Ted Bundy, um retrato detalhado da história dos crimes e da caça por Ted; Bandidos na TV, seriado nacional que aborda a história do apresentador de TV Wallace de Souza, acusado de orquestrar assassinatos para reportá-los em seu programa; o recente documentário Amanda Knox, uma narrativa sobre o assassinato de uma universitária numa república italiana cuja principal suspeita era a intercambista estadunidense que dá nome ao filme, entre outras criações (muitas que não abordam, necessariamente, crimes de assassinato). 

Sucessos como Extremely Wicked, Shockingly Evil and Vile, Conversando com um serial killer: Ted Bundy e MindHunter mostram o padrão de uma audiência que cada vez mais parece procurar por entretenimento que fale sobre os monstros da vida real algo que pode ser visto em outros canais e plataformas, como HBO, Hulu e Amazon. Para Alvino Augusto de Sá, psicólogo e professor de Criminologia no Departamento de Direito Penal, Medicina Forense e Criminologia da Faculdade de Direito da USP, em entrevista para o ESTADÃO, a fascinação por tal tema vem de uma questão intrínseca do ser humano. “A curiosidade tem a ver com o crime que está dentro das pessoas, as questões instintivas que existem em todos nós. A maioria controla, não se deixa levar. Mas ele [o criminoso] espelha um pouco aqueles instintos que existem dentro de nós”.

Série The Confession Tapes (Foto: Netflix/Divulgação)
Para além da curiosidade, há a empatia que nos toma em torno das vítimas. “As pessoas que se identificam com a vítima querem vingança, forma-se um clamor público que alimenta o julgamento formal feito pelo Estado”, explica o psicólogo. Não é de surpreender, portanto, que não só a mente criminosa fascina, mas também o ambiente que envolve os crimes. Por isso que ultimamente há tanto investimento para contar igualmente o que acontece àqueles que são afetados indiretamente pelos criminosos, sejam pessoas que conviveram com eles ou parentes das vítimas. Com o documentário sobre Ted Bundy, era a hora de falar um pouco sobre o que ele causou às pessoas que não foram assassinadas por ele, porém igualmente afetadas em outro grau é aí que entra a história de Elizabeth Kloepfer; e outras produções que não seguem somente a saga dos sádicos. 

O futuro é promissor diante das possibilidades de expansão do true crime. Por enquanto, os dois lançamentos da Netflix mais aguardados são a segunda temporada de MindHunter, prevista para agosto deste ano, e o remake da série Unsolved Mysteries, famosa no fim dos anos noventa para início dos anos 2000 por mostrar análises de crimes sem solução, ainda sem data. A matéria prima para novas criações, no entanto, está aí disponível. Com tantos crimes chocantes, não deve demorar para a próxima grande novidade tocar a campainha.

Nenhum comentário