Seguindo os Fatos: a série documental da Netflix e do Buzzfeed

Por Marcelha Pereira 

Com a premissa de acompanhar o dia a dia dos repórteres de diversas sedes do BuzzFeed, a Netflix lançou em 27 de setembro a segunda temporada de Seguindo os Fatos. A série documental foca em analisar os processos de investigação e construção de matérias com temas inusitados e polêmicos. A produção vem conquistando o público desde que sua primeira temporada foi lançada em agosto por seu jeito jovial de levar informação ao público. Agora, abordando novos temas relevantes, a tendência é que a série firme a sua audiência cada vez mais. 

Os episódios têm como foco desde questões mais conhecidas, como notícias falsas e vício em tecnologias, a assuntos pouco abordados, como trotes americanos que acabam em morte. Como o público do Buzzfeed é formado em sua grande maioria por jovens que participam ativamente da internet, ao produzir junto com a Netflix, eles passam a chamar a atenção de um público mais velho, interessado em se informar sobre assuntos que não conhece tanto. 

Seguindo do momento em que os repórteres iniciam a investigação sobre o tema até o final da reportagem, quando o repórter a escreve, os episódios mostram o máximo de pontos de vista sobre a temática em questão. Esse é o principal, e melhor, diferencial da série. Na maioria dos episódios não há sequer uma conclusão; o que os repórteres costumam entregar ao final é um questionamento para impulsionar a reflexão na mente do público. O espectador fica livre para formar sua própria opinião sobre o assunto. 

Assim, Seguindo os Fatos é um interessante objeto de estudo sobre o jornalismo. Deixando claro que a imparcialidade é algo difícil de se atingir, já que todos possuem suas opiniões e pré-conceitos sobre todos os assuntos, os repórteres buscam suprir essa barreira do ser humano apresentando e correndo atrás da maior quantidade de fatos que conseguirem. Os profissionais do Buzzfeed mostram que é possível construir produções sobre assuntos polêmicos sem serem tendenciosos. Prova disso é o quarto episódio da primeira temporada, onde a repórter Scaachi Koul, declaradamente feminista, conta que em 2016 recebeu ataques em seu Twitter por estar atrás de entrevistados que não fossem homens e brancos, sendo chamada de vadia, racista reversa e outros adjetivos ofensivos. 

A repórter percebeu que os ataques eram organizados e vinham de ativistas do Movimento pelos Direitos dos Homens (MRA – Men’s Right Activists) e, por isso, resolveu fazer uma reportagem para entender melhor sobre as pessoas que constroem esse movimento. Ela mostrou o lado negativo, os homens ativistas que se organizam para atacar virtual e fisicamente grupos de mulheres, e o lado positivo: os homens que entendem sua posição de opressão e se organizam para trabalharem seus sentimentos (amor, raiva, angústia, etc), para assim, juntos, se tornarem pessoas melhores. 

O ponto alto do episódio foi a entrevista com Karen Straughan, uma famosa defensora do MRA e uma das pessoas que xingou a repórter na rede social Twitter. Apesar de inicialmente desconfortável, Karen conseguiu expor sua visão sobre a falta de proteção a homens que sofrem com violência doméstica e Scaachi teve oportunidade de contrapontear os ataques virtuais e reais de ativistas do movimento, trazendo uma discussão saudável para o público. 

A função do jornalista é ser livre de preconceitos para que seja possível abordar as diversas temáticas e a série Seguindo os Fatos coloca isso à prova, ainda que em alguns momentos haja certo receio por parte do repórter em experienciar aquilo que ele está pesquisando. Foi possível ver essa hesitação no episódio sobre ASMR - prática que se refere a uma experiência de sensação prazerosa obtida através de sons relaxantes e repetitivos. 

Scaachi Koul vendo vídeos de ASMR no YouTube. 

Dessa vez, a repórter Scaachi vai à uma casa onde trabalham com esse fenômeno de relaxamento e resposta sensorial, mas é perceptível que não se abre totalmente para a vivência da prática de ASMR ao vivo, o que poderia ter sido mais interessante para ela. Ainda que o trabalho de apuração da temática e as entrevistas tenham sido bem-sucedidas, o formato da produção cobra dos repórteres uma entrega total. 

De forma geral, a série documental mostra na prática como o jornalismo pode, e deve, ser espaço para todas as visões. Não existe só um lado e é possível ouvir o máximo de pessoas com ideias e vivências diferentes sobre um mesmo tema. Seguindo os Fatos inspira o público a sempre buscar o maior número de informações antes de formar opinião sobre algo. Em tempos de notícias falsas, nunca foi tão necessário seguir a veracidade dos fatos. 

Confira o trailer da segunda temporada: