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Narcos: 3ª Temporada - Crítica

O inimigo é muito maior

Por PH Dias


[O TEXTO CONTÉM SPOILER]

Em uma temporada sem Pablo Escobar, os criadores da série partem para um caminho mais audacioso e direto, tematicamente falando. O tom documental da série é muito bem montado, pois mostra uma edição mais dialética das imagens reais como também das cenas ficcionais, oferecendo uma relação simbiótica dentro da finalidade do que a Netflix pretende.

Um dos pontos altos da série é o roteiro escrito por Carlo Bernard, Doug Miro, Chris Brancato, em que eles dão uma profundidade maior aos personagens, seja o principal - como é o caso do Javier Peña (Pedro Pascal) -, os chefões de Cali - Miguel Rodriguez (Damián Alcázar) e seu irmão Gilberto Rodriguez (Francisco Denis) - e até alguns secundários, como Javier Cámara (Guillermo Pallomari). E a maneira como os roteiristas exploraram os personagens é muito bem elucidada, mostrando qual relação cada um teve com o tráfico, o desenvolvimento familiar dentro desse contexto, como um cartel tinha o poder de controlar até os governantes da Colômbia e as consequências de se combater um problema social em um país mergulhado na corrupção.


A atuação de Pedro Pascal é excelente; ele consegue dosar bem todos os arquétipos do personagem, seja ele sendo um cara de família, como ocorre no primeiro episódio que mostra sua relação com o pai e com uma antiga namorada, seja ele indignado nas cenas com o Bill Stechner (Eric Lange), ou até ele sendo mais simpático e atencioso quando contracena com Christina (Kerry Bishe). Ou seja, vemos um agente Peña com muito mais camadas do que nas temporadas anteriores, como também mais presença em cena. E com isso guiando a trama da série até o seu final. 


Outro personagem que merece destaque é Jorge Salcedo (Matias Varela). Ele é chefe particular da segurança dos irmãos Rodriguez, sempre demonstrando que é uma pessoa mais tranquila, pacifista e de família. Essas características são muito bem construídas, principalmente com dilemas que fazem o espectador entender em qual situação ele se encontra, mas também as consequências dessas escolhas. Além disso, Matias encarna um personagem muito rico e que em alguns casos precisa até atuar para salvar sua pele, e ao mesmo tempo ser um segurança frio e meticuloso, que está do lado do “mal”, sendo também um homem mais sentimental quanto ao seu maior desejo. E em todas essas situações com uma interpretação segura.


Agora falando dos episódios em si, a série conseguiu mostrar qualidade em todos os 10 capítulos. Embora tenha alguns erros de desenvolvimento em alguns personagens, a história prende o espectador com tramas e subtramas muito bem explicadas e finalizadas (sugiro o episódio da captura do Miguel Rodriguez, que tem um tom mais de suspense e perseguição policial, detalhe da construção do clima que começa com os soldados em um caminhão disfarçado e termina com ele indo para o avião). Outro episódio interessante é o primeiro, pois mostra um agente Peña mais humano, bem como a explicação do funcionamento do Cartel e de seus aliados (destaque para a cena da morte de Salazar, o começo dela é bem coreografado até o corte da montagem onde ele está amarrado por 4 motos). Os capítulos dirigidos pelo cineasta brasileiro Fernando Coimbra são um dos melhores, porque ele consegue flexibilizar a trama ora para falar de assassinato, ora de amor, ora de ação, e tudo isso muito bem dosado com uma montagem bem cortada para que não enrole a história de algum modo. Os dois últimos são excelentes, seja pela tensão empregada no penúltimo episódio, seja pela grande reviravolta que ocorre no último momento, fazendo lembrar a trama de Tropa de Elite 2.


O seriado da Netflix tem alguns problemas quanto ao desenvolvimento de alguns personagens de importância da trama, que é o caso dos dois novos agentes da DEA, o Chris Feistl (Michael Stahl-David) e Daniel Van Ness (Matt Whelan); eles são muito mal explorados ao ponto do espectador não se preocupar com o destino deles na série. Outra questão mal explicada é a briga entre o cartel de Cali e os Norte Dell Vale, que não é finalizada, deixando algumas brechas no roteiro que a quarta temporada terá que mostrar.


No fim, a terceira temporada mostrou que o verdadeiro inimigo está entre nós e é muito maior do que imaginávamos. 

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